Li o livro e vi o filme, que poderia ser chamado de Narrativa sobre a cegueira. A história estava toda lá – enredo, personagens, diálogos, cenas fortes. Mas as análises e as interpretações da cegueira estão no livro, no ensaio.
São vários os cegos: os que lutam, os que amam; os cegos do olfato, os cegos do entendimento; os cegos pela fumaça de um incêndio, os cegos pelo medo. No livro há várias causas para a cegueira. Algumas escritas, outras lidas. A que eu prefiro é a que estamos cegos da cegueira dos outros e os outros estão cegos da nossa cegueira.
E o que se perde com a cegueira? Os olhos, por onde se vê a alma; as artes plásticas. E o que se ganha? A verdade que só pode haver em um mundo de cegos; a beleza de quem só pode ver em sonho.
A beleza e a cegueira. Lembrei-me de Saramago vendo Os Miseráveis na Band quando uma jovem bonita fica horrorizada com a aparência de dois presos. Ela comenta com Jean Valjean que os criminosos são feios, ao que ele comenta que devem ser bonitos aos olhos de Deus. A bela jovem diz: “Só se Deus for cego”. E Jean Valjean: “Basta que Ele seja bom”.
Nada mais necessário em um mundo de imagens, atitudes, aparências, corpos e significantes do que um ensaio literário sobre a cegueira. Transcrevo um pensamento que só a palavra pode expressar, um diálogo: “Quer dizer que temos palavras a mais, Quero dizer que temos sentimentos a menos, Ou temo-los, mas deixamos de usar as palavras que os expressam, E portanto perdemo-los”.
Pode alguém ver este blogue? Pode alguém ver este mosaico e seus fragmentos? Alguém que não cegou, que está cego, cego que vê, cego que, vendo, não vê? Pode este alguém ver este blogue?